Estudo inédito mostra quão prejudicial à saúde é a prioridade dada aos veículos na capital do país
Rafaela Lima, do Metrópoles
Brasília (18/11/2015) – Não é novidade para ninguém o mal que a poluição do ar faz à saúde das pessoas. Um estudo da Universidade de Brasília (UnB), entretanto, traz dados inéditos e revela a dimensão exata de quão prejudicial ela é aos brasilienses e sua relação com a ocupação do solo. A pesquisa, a que o Metrópoles teve acesso com exclusividade, mostra que cada seis quilômetros de ruas e avenidas construídos no Distrito Federal aumenta em 51% o risco de doenças cardiorrespiratórias.
Em contrapartida, um quilômetro quadrado de área verde entre as quadras da cidade significa duas internações a menos. O estudo traça uma relação entre o uso do solo, a principal fonte de poluição do ar no DF – que é a emitida pelos veículos – e a saúde do brasiliense. Os dados são de grande importância, já que nos últimos cinco anos, segundo o levantamento, 400 mil pessoas foram internadas na capital federal por doenças do sistema cardiorrespiratório e foram registrados 15 mil óbitos.
Levando em consideração o número elevado de veículos na cidade (0,6 por habitante) e o crescimento acelerado da área urbana (30% nos últimos 15 anos), o diagnóstico da pesquisa preocupa e acende o sinal de alerta.
Áreas mais afetadas
A tese defendida por Weeberb Requia, doutor em Geociência pela UnB e pela Universidade de Harvard, chama a atenção para o problema em regiões como o Núcleo Bandeirante, Ceilândia, Samambaia, Sobradinho e Guará. A maioria delas passa por um boom imobiliário nos últimos anos, com a construção de novas quadras de prédios residências. Outras, como o Bandeirante e Sobradinho, estão instaladas ao lado de vias de intenso movimento, como a Estrada Parque Núcleo Bandeirante (EPNB) e a BR-020, respectivamente.
O pesquisador destaca que o monitoramento da qualidade do ar no Distrito Federal “é precário” e alerta para os problemas causados pela ocupação não planejada do solo. Ele chama a atenção para o custo do Estado para atender e tratar desses doentes.
“É muito mais barato prever e manter áreas verdes como política de saúde pública.” (Weeberb Requia, pesquisador)
“Criei um banco de dados da saúde em formato espacial e dados de contexto urbano, como fontes de poluição atmosférica, queimadas, população etc. Os resultados que encontrei são novos e podem ser essenciais sobretudo para a tomada de políticas públicas”, explicou.
Zoneamento Ecológico-Econômico
A pesquisa, inclusive, já está nas mãos da subsecretária de Planejamento Ambiental e Monitoramento da Secretaria do Meio Ambiente, Maria Sílvia Rossi. De acordo com ela, o estudo foi incorporado ao plano de Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE). O texto indicará como e onde devem ocorrer novos empreendimentos e ocupações do solo da cidade, com respeito às peculiaridades demográficas e ambientais de cada região administrativa.
O documento é uma obrigação de todas as unidades federativas, estabelecida por lei federal desde 2012 e pela Lei Orgânica do Distrito Federal. “Existe, realmente, essa relação entre saúde pública e quantidade de áreas verdes. Não podemos e não vamos ignorar isso”. Ela antecipa que o governo local está estudando a criação de pequenos espaços verdes em vários pontos do DF que possam, de alguma forma, fazer essa compensação em relação à poluição provocada pelos veículos.
O comerciante Elmer Rosa sabe o que é sofrer com frequência por conta da poluição produzida pelos veículos. Com um loja na Rodoviária do Plano Piloto, localizada em frente a plataforma F, ele enfrenta há 10 anos a inalação da fumaça dos ônibus. “Sofro de sinusite crônica e a poluição só piora. Meu nariz vive ardendo e minha face dói o tempo todo. Já fiz cirurgias, mas se não sair daqui, sei que vai ser difícil diminuir as crises”, disse.
Moradora do Núcleo Bandeirante, Maria Lourdes também enfrenta as filas dos hospitais na busca de remédios para a neta, que tem asma. “Minha neta fica muito tempo comigo. Como moro perto da Estrada Parque Núcleo Bandeirante (EPNB), acho que a poluição só piora. É comum eu correr com ela para o hospital”, afirmou.
Monitoramento
As estações de monitoramento de qualidade do ar no DF são poucas e estão precárias. Existem apenas sete estações fixas que, segundo Requia, são mal distribuídas espacialmente. “Grandes centros de atividades no DF ainda não estão no radar dos satélites. Nós estamos na capital do país, onde o monitoramento deveria ser melhor. Somado a isso, temos um clima seco, propício a uma concentração enorme de focos de incêndios. São várias as fontes de poluição atmosférica por aqui”, completa.
O problema não atinge somente o DF. Requia aponta levantamento de que em todo o Brasil existem apenas 252 estações de monitoramento, enquanto que nos EUA há aproximadamente 5 mil, e no Japão e Alemanha 1,8 mil.
ZEE-DF