A articulação de dados ambientais e socioeconômico, na escala cartográfica 1:10.000, permite abordagem dos riscos ecológicos, da ocupação territorial. A lei que instituirá o ZEE poderá iluminar a gestão territorial para a diversificação do setor produtivo, além de influir decididamente no licenciamento dos empreendimentos.
James Allen*, para a Revista Brasília em Debate
O Governo do Distrito Federal (GDF) entrega este ano ao debate da sociedade um projeto de lei para implantar o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE/DF). A minuta do projeto é resultado de uma articulação de oito secretarias do GDF e diversos órgãos executivos. Todas as áreas responsáveis pela gestão do território estão envolvidas no processo, até porque o ZEE conta do programa de governo de Rodrigo Rollemberg e está previsto na nossa lei orgânica.
O resultado é um conjunto de diretrizes e de mapeamento das vocações de duas grandes zonas territoriais a partir de uma perspectiva completamente nova. O ZEE, ao entrar em vigor, oferecerá critérios e meios para que governo, empresários, agricultores, ambientalistas, investidores e a sociedade civil tenham clareza dos rios ecológicos, dos potenciais produtivos e econômicos e das condições sociais na dinâmica da ocupação pela população.
Por isso mesmo, uma intensa negociação foi iniciada no ano passado com todos os segmentos envolvidos. Empresários, advogados, acadêmicos, além de empresas do governo, debruçaram-se sobre os desafios da ocupação territorial a partir de uma perspectiva das unidades hidrográficas e não a partir somente da divisão políticas, como adota, por exemplo, o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT).
Além disso, o zoneamento oferece maios para que a gestão leve em conta a busca permanente da equidade social, respeitando as demandas ambientais. A nova escala cartográfica de 1:10.000 – em outros estados, a utilização varia de 1:2.500.000 a 1:250.000 -, a forma de governança, o critério das subzonas com vocações específicas e a abordagem a partir da hidrografia completam o arcabouço de inovação, informa o coordenador de monitoramento ambiental da Subsecretaria de Planejamento e Monitoramente, Rogério Barbosa da Silva. “E qualifica como nunca na nossa história os instrumentos para a gestão territorial do DF”, conclui.
Essas inovações estão consolidadas, por exemplo, em cadernos técnicos que estabelecem diretrizes gerias e específicas para todo o território e se prestam á definição das 13 subzonas do ZEE. Os dados georreferenciados já estão disponíveis aos usuários do GDF.Net.
“É um dos principais legados da política ambiental deste governo para o desenvolvimento sustentável”, avalia o secretário do Meio Ambiente, André Lima.
Diretrizes do ZEE mobilizam o setor produtivo
O Zoneamento Ecológico-Econômico chegou a ser considerado mais importante do que o PDOT pelo representante da Federação das Indústrias de Brasília (Fibra), Antônio Carlos Navarro, na reunião conjunta do Conselho de Recursos Hídricos (CRH) e do conselho do Meio Ambiente (Conam) do DF, em 6 de julho último. “É um divisor de águas na gestão do território”, apontou.
O ZEE é dividido em duas grandes zonas, segundo a estrutura hídrica. Um é a Zona Ecológica – Econômica de diversificação Produtiva e Serviços Ecossistêmicos (ZEE/DF). Como anuncia o nome, prioriza a preservação dos serviços ecossistêmicos, embora a assovie com as demandas do crescimento populacional.
A outra é a Zona Ecológica–Econômica de Dinamização Produtiva com Equidade (ZEEDPE). Esta é caracterizada por oferecer oportunidade á busca da equidade social e á diversificação da nossa indústria e comércio, com a possibilidade de aumento na oferta de emprego e renda.
Essa caracterização, segundo Navarro poderá fazer do ZEE um instrumento de crescimento da indústria local. “Será possível internar receita no DF, além de criar empregos, com o crescimento do nosso Produto Interno Bruto (PIB)”.
É que, a partir dessa perspectiva, o setor produtivo tem indicações de regiões com vocação para a criação de cadeias de empresas que poderão promover o círculo virtuoso da economia local. “Por isso, defendo a aprovação rápida pela Câmara Legislativa”, registrou o representante da Fibra.
Naquela reunião, o secretário de Gestão do Território e Habitação (Segeth), Thiago de Andrade, salientou a vantagem de o novo instrumento da base para decisão futura de forma articulada entre as áreas do meio ambiente, agricultura, desenvolvimento urbano, econômico e mobilidade. “Todas as áreas do governo que tratam do território estão alinhadas”, assegurou. “É preciso consolidar as cidades que já existem e que têm grande potencial de desenvolvimento”, afirmou. O secretário defende que se rediscuta o conceito de que baixa densidade urbana é bom para a população.
Base técnica
“Estão sendo feitas todas as conversas para assegurar o máximo ao apuro técnico na proposta a ser enviada a Câmara Legislativa”, afirmou o secretário de Meio Ambiente, André Lima. A intenção é levar o texto a todos os fóruns possíveis para que se construa um acordo para a sua aprovação.
Assim, então incluídos nesse roteiro o Conselho de Planejamento Territorial e Urbano (Conplan), o Conselho de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) e o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). A negociação com os parlamentares inclui o pedido para a realização de uma audiência na Comissão do Desenvolvimento Econômico Sustentável, Ciências, Tecnologia, Meio Ambiente da OAB/DF, outro na Fibra e também no Fórum de Organizações Não Governamentais.
Também estão programadas três consultas (contemplando as regiões sudoeste, central e nordeste do DF, em Samambaia, Plano Piloto e Sobradinho, respectivamente) e uma audiência pública. “Após a sistematização de todas essas informações, o propósito é que o texto seja encaminhado ao governador e a mensagem do Poder Executivo chegue ao Legislativo”, apontou André Lima.
As negociações sobre o ZEE estão sendo conduzidas dentro da Coordenação Geral Políticas do ZEE, instituída pelo governador Rodrigo Rollemberg, em maio de 2015. É integrada pelos secretários de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (Seagri); de Economia e Desenvolvimento Sustentável (SEDS); de Gestão do Território e Habitação (Segeth); do Meio Ambiente (Sema); de Planejamento, Orçamento e Gestão (Seplag); de Mobilidade (Semob); e pela Casa Civil.
Portaria conjunta 19, de 17 de abril, criara, antes, a Coordenação Geral Técnica do ZEE (com a Sema, SEDS, Segeth e Seagri) e a Comissão Distrital para articularem as informações e subsidiar as decisões tomadas pelo secretário de Estado. São 25 órgãos distritais e três entidades federais (Embrapa, Ibama e ICMBio) que compõem a comissão técnica.
Bilaterais
O alinhamento técnico sobre as condições da ocupação do território, as características hídricas e os riscos ecológicos exigem do corpo técnico um aprofundamento das questões específicas das áreas estudadas junto a diversos segmentos da sociedade, do governo local e federal, assim como do setor produtivo e acadêmico. Nesse sentido, foram realizadas reuniões na Embrapa Cerrados, Fibra, em conselhos com o Interdisciplinar de Direitos Animais (CIPDA), Conselho de Recursos Hídricos (CRH), Conselhos do Meio Ambiente (Conam), além ser acompanhado pela 3ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (Prodema), do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT). Acompanha ainda as discussões a Diretoria de Zoneamento Territorial (DZT), do Ministério do Meio Ambiente (MMA), gestor do ZEE do Brasil.
Duas zonas de 13 subzonas – oferta da água
A premissa do zoneamento é apontar os riscos e as oportunidades que o nosso quadrilátero oferece principalmente em relação á água. Foram levantadas ainda as informações sobre o solo, a fauna e vegetação, as mudanças climáticas e o bem-estar de sua população.
Fundamentalmente, o ZEE aponta para duas grandes zonas, coerentes com seu binômio – ecologia e economia. Uma, com forte tônica de preservação dos serviços ecossistêmicos, principalmente da água (70% do território). E outra, com a principal vocação de desenvolvimento econômico (30%).
Dessas duas grandes zonas, desdobram-se subzonas com cenários de tendências dominantes, riscos ecológicos e interesses de segmentos sociais. Para tanto, o zoneamento integra as características da infraestrutura ecológica, funções ecossistêmicas e serviços ecossistêmicos do Distrito Federal.
Serviços ambientais ou serviços ecossistêmicos são os benefícios que a população recebe da natureza. Proteção contra enchentes ou desabamentos, controle da erosão, polinização das flores pelas abelhas, fertilização do solo pelas fezes de animais, decomposição de animais e plantas por microrganismo são exemplos disso.
Água
A Coordenação Geral Técnica adotou a água como elemento norteador para os estudos técnicos e a definição de diretrizes gerais e específicas. Tal abordagem – a água como dimensionadora do risco da gestão territorial – dá a todos a condição de compreender as principais características da ocupação populacional no DF. E, principalmente, permite adotar como critério para a gestão, presente e futura, todas as dimensões da sustentabilidade, especialmente a ambiental.
O Zoneamento apresenta ao brasiliense – seja cidadão ou governante – o desafio de escolher o caminho da consolidação da infraestrutura ecológica, ao passo em que se desenham os espaços, habitados ou explorados economicamente, frente aos níveis de impermeabilização do solo urbano. Para tanto, foram utilizados como base do zoneamento quatro riscos ambientais: a Impermeabilização do solo, com perda de recarga do aquífero (água subterrâneas), a contaminação e perda de solo por erosão, além da degradação de vegetação nativa.
Segurança ambiental
Eis que a primeira é a Zona Ecológica–Econômica de Diversificação Produtiva e Serviços Ecossistêmicos (ZEEDPSE), caracterizada pela predominante necessidade de segurança ambiental. Visa á preservação dos serviços ecossistêmicos, oferecidos aos próprios locais em que se situam – ou ao DF como um todo.
Na porção oeste estão o Lago Descoberto e a represa de Santa Maria. É a SZSEI – Produção Hídrica (veja o mapa das subzonas). Área com uma urbanização reduzida, onde está Brazlândia. Aqui, o critério da preservação da quantidade e qualidade da água é o mais relevante. Nessa região ocorre produção de 88% da água que abastece o DF.
A partir do noroeste do DF, por todo o seu norte, está a subzona com o maior nível de preservação do Cerrado (SZSE2 – Potencial Econômico de Conservação). Ali, está a bacia do Rio Maranhão, região com tônica possível para o turismo ecológico.
A bacia do São Bartolomeu está em outra subzona (SZSE3 – Disponibilidade Hídrica e Corredores Ecológicos), que percorre desde o extremo nordeste do DF até p seu extremo sul, entre a bacia do Paranoá e a do Preto – no meio leste. Região que demanda cuidados em relação á construção de áreas habitacionais, por ser o desaguadouro preferencial de esgoto tratado – o que aumenta o risco ecológico dos cursos d’água na área.
A ZEEDPSE abrange ainda toda a fronteira leste, com a bacia do Rio Preto, ocupado predominantemente pelo agronegócio (SZSE4 – Gestão da Água para Atividade Econômica). Ali, o debate se dá pelo risco de contaminação do solo e pelas atividades intensivas com irrigação, por exemplo.
Finalmente, a SZSE5 (Alto Risco Ecológico) mantém importantes maciços de cerrado em pé, com evidente vocação para a preservação, ao sul, na região da bacia do Paranoá. Por isso mesmo, é a subzona mais restritivas do ponto de vista de risco ambiental, por reunir dois ou três riscos ambientais e oferecer importantes serviços ecossistêmicos para a sociedade.
A ZEEDPSE tem, portanto, como principal vocação, a preservação da sua permeabilidade e, por tanto, a conservação máxima possível da infraestrutura ecológica, das funções e dos serviços ecossistêmicos prestados pela natureza, principalmente em relação á preservação da oferta de água.
Dinamização Produtiva
A segunda é a Zona Ecológica–Econômica de Dinamização Produtiva com Equidade (ZEEDPE). É Caracterizado pela abrangência de todos os principais núcleos urbano do DF. O foco para a sua definição é a inclusão social pela diversificação da economia, com geração de emprego e renda.
Começa no extremo sudoeste (SZDPE1) passando pelo Gama (SZDPE2) até Sobradinho, a nordeste (SZDPE6), desde Vicente Pires (SZDPE3) até Santa Maria, incluindo o complexo urbano do Plano Piloto (SZDPE4). Abrange ainda a região do Jardim Botânico e de São Sebastião (SZDPE7), nos limites da bacia do São Bartolomeu, e inclui a área do Taquari e Serrinha (SZDPE5).
A ZEEDPE, de intensa urbanização, tem vocação para a estruturação de um programa de desenvolvimento econômico, habitacional e empresarial. Poderá ser modulado pelos gestores, de forma a minimizar os riscos ambientais, conforme são apresentados pelo zoneamento.
Contudo, sua tônica de ocupação, além de ser irretroagível, pode ser aproveitada de modo que a infraestrutura a ser desenvolvida aproveite a tendência histórica de ocupação territorial.
A SZDPE1 (denominada Plataforma Sudoeste de Integração de Modais de Transportes) – sem vocação para projetos habitacionais – poderá abrigar estruturas industriais que ofereçam empregos aos moradores das cidades do Gama, Samambaia, Riacho Fundo, Santa Maria ou das cidades vizinhas em Goiás, já que ali está a saída para a cidade em Santo Antônio Descoberto. Esse complexo urbano inclui 650 mil habitante (na vizinha SZDPE2). É a subzona que admite receber, em longo prazo, um complexo ferroviário para a diversificação dos modais de transporte.
A SZDPE2 (Eixo Sudeste de Desenvolvimento), intensamente urbanizada, merece, de acordo com a proposta da lei, uma qualificação para ampliar a permeabilidade e garantir maior condição de sustentabilidade. Abriga um grande contingente populacional de baixa escolaridade e baixa renda, e a quem devem ser oferecidas oportunidades de emprego e renda com o desenvolvimento do comércio e de outros serviços. Segundo o ZEE, a estruturação produtiva da SZDPE1 poderá atender a essa demanda socioeconômica.
A SZDPE3 (Qualificação da Infraestrutura para Proteção do Lago Paranoá) abriga a bacia do Paranoá. O intuito é que o projeto de desenvolvimento seja submetido a um critério de qualificação da infraestrutura para a proteção do lago. A preservação ou a recuperação dos seus tributários – particularmente do córrego Riacho Fundo – é fundamental para garantir a qualidade da água. O risco de contaminação é alto com o adensamento urbano sem critérios para a sustentabilidade.
O Lago Paranoá e o Plano Piloto estão na SZDPE4 (Usos Múltiplos do Lago Paranoá). Área tombada como Patrimônio da Humanidade, onde a grande vocação é o turismo, mas que deve ser desenvolvido dentro do contexto de proteção contra os riscos ambientais.
A SZDPE5 (Controle do Uso do Solo para Proteção do Lago Paranoá) é totalmente ocupada pela Bacia do Rio São Bartolomeu e onde estão o bairro Jardim Botânico e São Sebastião – Área de risco de erosão e assoreamento do rio.
Sobradinho e Planaltina estão na SZDPE6 (subzona de Controle do Uso do Solo para Proteção do Rio São Bartolomeu), que inclui a área da Estação Ecológica de Águas Emendadas (embora não seja em área contínua, mas pela similitude no quadro de riscos). Sua vocação é o desenvolvimento produtivo com o intuito de gerar emprego e renda para essas populações, ao se instalarem, por exemplo, complexos voltados para a logística de transportes. Contudo, não se recomenda o adensamento populacional.
A região do Taquari entre o complexo hídrica do Paranoá e o Rio São Bartolomeu são a SZDPE7 (Desenvolvimento Produtivo Norte). Os riscos, que ali se apresentam, apontam para a preservação da qualidade da água pela proteção das nascentes e demanda por saneamento ambiental. O controle do adensamento urbano deve levar em consideração os impactos possíveis no Lago Paranoá.
No extremo sul está a SZDPE8 (Ocupação Sustentável), caracterizada pela presença relevante de áreas particulares ao longo da rodovia DF – 140 e, portanto, deverá cumprir um papel de desenvolvimento socioeconômico. Contudo, é possível vocacionar aquela área para a diversificação da produção do Cerrado nativo, mesmo no espaço urbano. Naquela região, o governo defende a instalação de um polo de desenvolvimento para o setor de saúde e farmacêutica e um outro, de entretenimento.
Assim, a ZEEDPE pode acolher projetos habitacionais, estruturas industriais, plataformas logísticas, vias rodoviárias e ferroviárias que podem completar o complexo de infraestrutura já existente. A proposta procura fortalecer a aproveitar a tendência da produção e do fluxo da riqueza em direção ao sudoeste do território para os outros estados.
Publicado na Revista Brasília em Debate, da Codeplan – Ano 2016 – Outubro – nº 14 – Página 36.
*James Allen é Jornalista e Chefe da Assessoria de Comunicação da Sema.
ZEE-DF